sábado, março 31, 2007

Foi bom. Muito bom.


Ali em baixo, ao cabo do terreno que me viu crescer, existe um pequeno ribeiro que corre livre. Quando era criança, costumava ir ao seu encontro a passos largos. Corria, saltava e os arranhões pelo corpo eram inúmeros. Às vezes ia até lá sozinha, sem dizer nada a ninguém. Gostava de ouvir correr a água, sem qualquer vestígio humano. Não aprendia nada em particular, mas despia-me de mim para mim.
Quando voltava a aparecer, a minha mãe já tinha o discurso preparado. Colocava nas feições faciais um ar insultuoso e eu acabava por ouvir das boas, pelo facto de desaparecer sem justificação. Contudo, repetia o trajecto na clandestinidade vezes sem conta.
A caminho, era costume encontrar cogumelos e trazê-los comigo como prémio. Alguns não prestavam mas eu, à revelia, colocava-os no colo e depois corria até a casa. Curiosamente, depois não os comia. Mas pintava-me de ouro, só para os apanhar.
Lembro-me que havia um castanheiro enorme, com largos anos de existência, detentor de uma sombra majestosa. Mas, não era pela sombra que lá gostava de passar. Atraíam-me as castanhas espalhadas no chão do Outono que principiava. Confundiam-se por entre a erva que começava a fraquejar e a perder a cor.
Ontem voltei a fazer este trajecto com o meu pai. Fomos com o intuito de apanhar agriões. Calcei os botins, saltei para a água e apanhei uns quantos.
Tinha saudades de ir ali abaixo respirar outro ar, sujar-me de erva, molhar-me.
Voltei a respirar liberdade como se tivesse sete anos. Foi bom. Muito bom.

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