terça-feira, novembro 07, 2006

Sedução não seduzível

A sedução não tem que ser material. Um mero jogo de cintura, de apreciação carnal, de cedência aos estímulos visuais e apetecíveis. A beleza, por si só, é tão frágil que se existisse isoladamente num à parte não perecível, já estaria extinta. Seria secante, deprimente e insuportável. A matéria da beleza é a pessoa, aquilo que não está numa simples soma de genes exprimidos por um fenótipo. O que os olhos captam é apenas momentâneo e incrivelmente vazio. Tão vazio que chega a gelar. Gela pelo calafrio que nada tem, pelo estrondo tão enganador a que todos acedemos sem hesitar, pela fragrância exótica de uma matéria sem odor. E, se algum odor exala, é uma mistura sem doses certas. Uma amálgama que ninguém define mas que todos farejam a léguas como se se tratasse de um perfume que não tem intimidade com os tecidos, mas que o nariz sabe exactamente onde localizar.
A sedução é mais do que um conjunto de características bem rotuladas a que cada um de nós responde com apreço. É aquilo que toca e volta a tocar. Toca de levezinho e vai acumulando detalhes tão pequeninos que nem sequer nos atrevemos a procurar, mas com os quais nos envolvemos. Não é vazia, volátil. Começa precisamente onde a beleza acaba. São domínios que não se interceptam mas chegam a aproximar-se. Seduzir não é ser belo porque se tem uma fisionomia desejável, é antes preencher as lacunas da fragilidade da beleza. A sedução é a encarnação de uma matéria não definível capaz de habitar no mundo dos fragmentos desprovidos de forma, mas com um conteúdo que a beleza jamais atingirá. Não é parecer-se mas ser-se.

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